quinta-feira, 31 de janeiro de 2013

A comunidade rural da Chã de Jardim no município de Areia-PB destacando-se pelo mundo

O brejo de Luciana - Publicado por: Lucila Brito | 27/01/2013

Partimos, meu esposo e eu, rumo ao interior da Paraíba, com destino ao Planalto da Borborema. Mais precisamente, para o município de Areia. Situado a cerca de 600m de altitude, patrimônio cultural brasileiro, sede de um campus da UFPB e local de uma ecorregião tipicamente nordestina, a Floresta de Brejos de Altitude, pareceu-me um destino perfeito para começar a conhecer o estado.
Comecei o roteiro arrastando meu esposo para uma trilha na Reserva Ecológica Mata do Pau Ferro. Não que ele não goste de programas do gênero. É mais afeito a estes que eu, na verdade. Mas, tinha a obrigação de seguir meu planejamento milimétrico. E estávamos atrasados.
Lá, fomos recebidos por uma moça muito simpática e solícita, que se ocupava de atender os visitantes no quiosque dedicado a expor o trabalho de artesanato em palha de bananeira, manufaturado pelas mulheres da Comunidade Chão de Jardim. Prometeu arranjar um guia, mas, não dispondo de ninguém para nos acompanhar na empreitada, foi, ela mesma, realizar o trabalho de nos guiar pela trilha mais curta, a Trilha das Flores, com 2Km de extensão. Não se engane com essa distância, o percurso circular começa com um declive e termina numa senhora subida, boa para testar pulmões sedentários habituados ao nível do mar.
Luciana Balbino – esse era o nome da moça, começou informando que as trilhas, geralmente, são feitas por escolas, e que, na preparação para as trilhas, ela contextualizava para a turma os aspectos tratados em sala de aula. Então, apresentava os líquens, as orelhas-de-pau, epífitas, etc. A nós, Luciana também informou sobre como surgiu a mata do pau-ferro, que é uma mata secundária, surgida após circunstâncias políticas e socioambientais paraibanas na década de 30, que levou a desapropriação de engenhos naquela região, o que favoreceu a retomada da área pela vegetação nativa. Luciana, ainda, informou-nos dos vestígios de engenho dentro da mata, representados por ruínas de fundação das instalações destes e pela presença de árvores frutíferas, como a macaíba. E, por fim, Luciana nos contou toda a representatividade da cidade de Areia no contexto sócio-político, econômica e cultural da Paraíba e como a Floresta de Brejos de Altitude teve importância nessa história.
Luciana nos contou tudo isso sem um texto prévio. E sem perder o fôlego na subida da trilha. Ela apenas respondia nossas perguntas sobre a ação da universidade na reserva, sobre o surgimento da reserva, sobre as comunidades negras na região, sobre a ação do estado na reserva e junto à população tradicional da Mata do Pau Ferro. Luciana é historiadora, nascida na região de Areia e apaixonada pelo Brejo Paraibano.
Em um momento de pausa para que nós, visitantes, recuperássemos o fôlego, elogiei a capacidade de Luciana em dar uma aula transversal. Fiz sem saber que Luciana ganhou, em 2009, o Prêmio Margarida Maria Alves, por seu trabalho nessa área e junto às mulheres e jovens da Comunidade Chão de Jardim. Luciana citou isso, depois, casualmente, quando nos contava a história de Margarida Alves.
Casualmente, também, chamou a atenção de caçadores que cruzamos na trilha e criticou a ausência de extensão universitária e fiscalização do estado na Reserva. Mas, calorosamente, chamou-nos para tomar um suco de acerola, despediu-se e, logo, atravessou a estrada, para cuidar do andamento da fábrica de polpa de frutas da Comunidade Chão de Jardim, a Doce Jardim.
Foi isso que admiramos em Luciana. Admiramos, ainda mais, quando foi enfática e esperançosa em demonstrar a preocupação com a ausência do poder público na gestão da Reserva e no apoio às comunidades do brejo. O Governo Estadual criou a Reserva, deu casas à população tradicional, estabeleceu uma infra-estrutura de beneficiamento de castanha para garantir renda a esta, construiu guaritas e pontes… Mas, os deixou lá, sem supervisão, sem capacitação. Máquinas se deterioram, instalações foram depredadas, a polícia florestal não atua na área, a gestão governamental se dava a distância e a população desconhecia como gerir a Reserva e a instalação de beneficiamento. Mas, Luciana reconhece os esforços recentes de diversas instituições, tem esperanças nas ações previstas pelo governo do estado, e, acredita que será dada a devida importância às comunidades e a Reserva Ecológica Mata do Pau-Ferro, que, é provável, vem a ser o único remanescente de Floresta de Brejos de Altitude na Paraíba.
Sentados, no aclive de retorno, conversavam, dois educadores – Luciana e meu esposo, e eu, sobre a importância da contextualização do conhecimento para o aprendizado. Lembrávamos que muitos livros utilizam exemplos distantes de fauna e flora para educar nossos estudantes.
Bem, já estive do lado setor produtivo. Sei da necessidade de se explorar, mesmo que meu trabalho fosse para que se desse com sustentabilidade. E, por isso, compreendo muito mais a importância de se conservar. Entretanto, sem conhecimento, a conservação ambiental é, apenas, um slogan de governo, que pode acabar em quatro anos, ou menos.


O trabalho de Luciana, premiado e admirado por quem o conhece, grita que está na hora de se colocar o brejo, a caatinga, o Nordeste, como um todo, nos livros. Para que todos saibam o que se pode perder e, como se pode usufruir. Digo isso, porque ficou na minha cabeça o que disse Luciana Balbino, na subida da Trilha das Flores: o estudante pensa que o Brejo, a Floresta de Altitude, não tem importância, porque não está no livro.

2 comentários:

  1. Texto necessário de ser lido por todos, para que possam amar a região do Brejo Paraibano e conhecer (e valorizar) o importante trabalho da educadora Luciana Balbino!

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  2. 👏🏻👏🏻👏🏻 vi um vídeo dela no facebook Luciana é sem dúvidas um exemplo de mulher de fibra e muita coragem, merece muito reconhecimento e milhões de prêmios e maiss

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